Tosse aguda e subaguda (Diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia)

II Diretrizes Brasileiras no Manejo da Tosse Crônica (da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia)

 OBS. Os números entre parênteses correspondem às referências bibliográficas do documento em apreço (II Diretrizes), disponível no final deste texto.

TOSSE

DEFINIÇÃO

A tosse constitui um sintoma de uma grande variedade de patologias, pulmonares e extrapulmonares, e por isto mesmo é muito comum, sendo, com certeza, uma das maiores causas de procura por atendimento médico.

Este sintoma produz impacto social negativo, intolerância no trabalho e familiar, incontinência urinária, constrangimento público e prejuízo do sono, promovendo grande absenteísmo ao trabalho e escolar, além de gerar grande custo em exames subsidiários e com medicamentos.Causas infecciosas da tosse

Classificação

  • Aguda: é a presença do sintoma por um período de até três semanas.
  • Subaguda: tosse persistente por período entre três e oito semanas.
  • Crônica: tosse com duração maior que oito semanas.tuberculose

TOSSE AGUDA

Apesar da falta de estudos prospectivos com grande casuística, a experiência clínica indica que as maiores causas de tosse aguda são as infecções virais das vias aéreas superiores, em especial o resfriado comum, e das vias aéreas inferiores, com destaque para as traqueobronquites agudas.(12)a02fig01

Outras causas comuns são as sinusites agudas, exposição a alérgenos e irritantes, e exacerbações de doenças crônicas como asma, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e rinossinusites.a02tab01

Além dessas entidades com baixo risco de complicações, outras doenças potencialmente graves como pneumonias, edema pulmonar por insuficiência ventricular esquerda, embolia pulmonar e exacerbações graves de asma e DPOC podem manifestar-se com tosse aguda e, ao contrário das causas anteriores, necessitam de intervenção precoce devido ao risco de complicações.

A seguir as características das principais causas de tosse aguda.a02tab02

Resfriado comum

O diagnóstico é altamente sugestivo em pacientes com doença das vias aéreas superiores caracterizada predominantemente por tosse, sintomas nasais como rinorreia mucosa ou hialina, espirros, obstrução nasal e drenagem pós-nasal de secreções, concomitantes a lacrimejamento, irritação da garganta, ausculta pulmonar normal, com ou sem febre.(13)

Na etiologia estão envolvidos mais de 200 vírus, em especial rinovírus, coronavírus, parainfluenza, vírus respiratório sincicial, adenovírus e enterovírus.

Quanto à fisiopatogenia, há gotejamento nasal posterior e aumento da sensibilidade dos receptores aferentes das vias aéreas inflamadas.Causas não infecciosas da toseCom relação à propedêutica, em estudos tomográficos o acometimento dos seios da face aproxima-se de 80%, e as alterações usualmente são indistinguíveis daquelas da sinusite bacteriana.(14)

Estas anormalidades resolvem-se espontaneamente em menos de vinte dias, inclusive nos casos com níveis hidroaéreos.

Por este motivo, não são indicados estudos de imagem, especialmente radiografia dos seios da face, na primeira semana de resfriado.

Os anti-histamínicos de primeira geração associados a descongestionantes de longa duração são os medicamentos mais eficazes para o tratamento.(15)

Antitussígenos periféricos, expectorantes e mucolíticos têm pouco valor no tratamento da tosse aguda.(16-17)

Os antibióticos não devem ser usados de rotina, apesar da grande dificuldade de diferenciação entre resfriado e sinusite bacteriana, e desta forma complicar o resfriado em 1% a 5% dos casos.

Traqueobronquite aguda

A traqueobronquite aguda é responsável por mais de 10 milhões de consultas médicas por ano nos EUA. Apesar de todos os avanços na área da saúde, persiste como um dos maiores motivos de uso desnecessário de antibióticos.

O diagnóstico provável dá-se com o paciente com infecção respiratória aguda manifestada predominantemente por tosse, com ou sem expectoração, que pode ou não ser purulenta, com duração inferior a três semanas, e sem evidência clínica e/ou radiológica de resfriado comum, sinusite, exacerbação da DPOC ou crise de asma.(18)

asma

A etiologia é viral na maioria dos casos, especialmente por influenza A e B, parainfluenza e vírus respiratório sincicial.

Em menos de 10% das bronquites agudas são identificadas bactérias e nestes casos as mais comuns são o Mycoplasma pneumoniae, Chlamydophila pneumoniae e ocasionalmente a Bordetella pertussis.

A traqueobronquite aguda pode causar obstrução do fluxo aéreo e hiperresponsividade brônquica transitórias, com duração inferior a seis semanas, em até 40% dos pacientes. Quanto ao tratamento, não existe medicação eficiente para a tosse da bronquite aguda.

Os antitussígenos têm pequeno efeito e os mucolíticos não são indicados.(16) Broncodilatadores podem ser úteis se houver indícios clínicos ou funcionais de obstrução do fluxo aéreo.

Estão indicados os macrolídeos em situações especiais como epidemias por atípicos e/ou quadro clínico sugestivo de coqueluche, contato com infectados, tosse emetizante e guincho, com duração de sintomas inferior a duas semanas.

Sinusite aguda

A rinossinusite aguda viral é pelo menos vinte vezes mais frequente do que a bacteriana e ambas são causas comuns de tosse aguda.(19)

O acometimento dos seios da face é comum nos resfriados, gripes e exacerbações das rinites.

A rinossinusite bacteriana complica de 1% a 5% das infecções virais de vias aéreas superiores. A suspeita de rinossinusite bacteriana deve ocorrer quando os sintomas de uma virose das vias aéreas superiores pioram após o quinto dia ou persistem por mais de dez dias.(19-20)

225-divulgacaoA presença de dois ou mais sinais maiores ou de um sinal maior e dois menores são altamente sugestivos de sinusite aguda.(21-22)

São sinais maiores: cefaléia, dor ou pressão facial, obstrução ou congestão nasal, secreção nasal ou pós-nasal purulenta, hiposmia ou anosmia, e secreção nasal ou pós-nasal purulenta ao exame.

São sinais menores: febre, halitose, odontalgia, otalgia ou pressão nos ouvidos e tosse.

O valor da radiografia de seios da face é controverso. Ela não é acurada para várias regiões da face, tem pouca utilidade para diferenciar infecção bacteriana de viral ou alterações alérgicas, e baixa relação entre custo e benefício, mesmo nos casos em que existe dúvida diagnóstica após história e exame físico.(19,23)

Não há necessidade de tratamento da sinusite viral que apresenta sintomas leves e resolução espontânea. Para as sinusites bacterianas preconiza-se amoxicilina por sete a dez dias. Dependendo da resistência local, evolução e uso prévio de antibióticos, podem ser usados amoxicilina com clavulanato, macrolídeos, cefalosporina de segunda geração e até quinolonas respiratórias (moxifloxacina e levofloxacina).(23)

A solução salina isotônica ou hipertônica e os vasoconstrictores sistêmicos podem ser usados por poucos dias. Os corticosteroides orais devem ser reservados para casos mais graves, com grande edema das mucosas e por curto período de tempo, inferior a sete dias.

Gripeestudo-dos-vrus-3-638

O diagnóstico da gripe não é difícil quando o paciente apresenta síndrome aguda caracterizada por manifestações constitucionais como febre alta, calafrios, prostração, fadiga, mialgia, cefaleia, sintomas de vias aéreas superiores e inferiores, com destaque para tosse e coriza, e sintomas oculares como lacrimejamento, fotofobia e hiperemia das conjuntivas.

Gripe ou sinusite?

Em algumas situações pode ser difícil diferenciar a gripe da sinusite bacteriana aguda e pneumonia, principalmente quando há rinorreia e/ou expectoração purulenta. Em caso de dúvida, deve-se realizar hemograma, dosagem de proteína-C e exames de imagens para esclarecimento do diagnóstico.

Principais causas

As causas mais importantes da gripe são os vírus influenza A e B, especialmente em surtos epidêmicos. O tratamento é fundamentalmente sintomático, com hidratação oral e uso de antitérmicos e analgésicos. Anti-histamínicos de primeira geração associados a descongestionantes podem ser úteis nos casos de tosse com drenagem pós-nasal.

Antitussígenos e anti-inflamatórios têm pouco valor terapêutico. Exacerbação de doença pré-existente Na avaliação do paciente com tosse aguda é fundamental identificar, através da história clínica, exame físico e quando necessário de propedêutica, casos de tosse devidos a crise de asma, exacerbação da DPOC, bronquiectasias infectadas e descontrole de rinossinusopatia.

Doença pulmonar obstrutiva crônica

As exacerbações da DPOC devidas a traqueobronquites bacterianas caracterizam-se pela piora da dispneia, mudança do aspecto do escarro para purulento e aumento do volume da expectoração.

Na DPOC leve ou moderada, em pacientes com poucas exacerbações por ano, os agentes etiológicos mais frequentes são: Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae e Moraxella catarrhalis.

Nos pacientes graves, com comorbidades ou muitas exacerbações, predominam as infecções por Gram negativos entéricos, Pseudomonas e S. pneumoniae resistente a penicilina.(24)

O tratamento da exacerbação infecciosa da DPOC inclui o uso de broncodilatadores, corticosteroides, oxigênio e antibióticos. O uso racional de antibióticos na traqueobronquite da DPOC baseia-se na sua gravidade, presença de comorbidades e número de exacerbações por ano:(24)

  • quadro leve a moderado, sem outras comorbidades e poucas exacerbações por ano – β-lactâmico associado a inibidor de β-lactamase, cefuroxima ou macrolídeo;
  • quadro leve a moderado, com co-morbidades ou muitas exacerbações por ano – antibióticos anteriores mais moxifloxacino, levofloxacina, ou telitromicina;
  • quadros graves, com ou sem co-morbidades e com muitas exacerbações por ano – moxifloxacino, levofloxacina, gatifloxacina ou ciprofloxacino (suspeita de pseudomonas).

Exposição a fatores irritantes ou alérgicos

Na avaliação de pacientes com tosse aguda é fundamental pesquisar a exposição a fatores alérgicos, ambientais ou ocupacionais que tenham relação temporal com o início ou piora da tosse.

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O afastamento da exposição, quando não houver doença respiratória pré-existente, como asma ou rinite, pode tornar desnecessário o uso de medicamentos para controle dos sintomas.

Uso de medicamentos capazes de causar tosse

É essencial identificar o uso de medicamentos capazes de causar tosse como os inibidores da enzima conversora da angiotensina (captopril, enalapril, etc) e os beta-bloqueadores. Os primeiros, por causarem tosse irritativa, sem expectoração em 10% a 20% dos seus usuários, que geralmente é diagnosticada antes de três semanas de uso. E os β-bloqueadores, inclusive na forma de colírios, por piorarem a obstrução das vias aéreas de pacientes com asma ou DPOC, e causarem tosse com ou sem dispneia e chiado.

Em geral, a tosse causada por medicamentos melhora em poucos dias após a suspensão dos mesmos. Quando necessário, deve-se utilizar broncodilatadores e/ou corticosteróides. Doenças potencialmente graves As doenças potencialmente graves, como pneumonia, edema pulmonar cardiogênico, crise grave de asma ou DPOC, e embolia pulmonar, geralmente não são difíceis de serem diagnosticadas quando causam tosse, uma vez que raramente se manifestam isoladamente por este sintoma.

O sucesso do manejo depende da instituição de propedêutica adequada e terapia específica para cada doença.

Tosse subaguda

No Consenso Norte-Americano de Tosse publicado em 2006 foi proposta nova classificação na qual a tosse com duração superior a três e inferior a oito semanas foi definida como tosse subaguda.(12)

Segundo a diretriz norte-americana, uma das causas mais comuns de tosse subaguda é a tosse pós-infecciosa, ou seja, aquela que acomete pacientes que tiveram infecção respiratória recente e não foram identificadas outras causas. Uma vez afastada a etiologia pós-infecciosa, o manejo será o mesmo da tosse crônica.

Tosse pós-infecciosa

O diagnóstico é realizado por exclusão, e devem ser considerados três aspectos fundamentais:(3)

  1. tosse com duração superior a três e inferior a oito semanas;
  2. avaliação clínica detalhada sem identificação de uma causa;
  3. história de infecção das vias aéreas nas últimas três semanas.

A fisiopatogenia é multifatorial, com extensa inflamação e lesão epitelial das vias aéreas, com ou sem hiperresponsividade transitória. Outros fatores que podem contribuir são a drenagem pós-nasal, acúmulo de secreções nas vias aéreas inferiores e agravamento de refluxo gastresofágico devido a alterações no gradiente pressórico toracoabdominal durante a tosse.

A etiologia relaciona-se, em geral, a infecções virais, ocasionalmente após infecções por B. pertussis, M. pneumoniae e C. pneumoniae.

A tosse em geral é autolimitada e resolve-se em poucas semanas. Não há tratamento específico.

Deve-se considerar o uso de brometo de ipratrópio e corticosteróides por via inalatória.(20) Em casos mais intensos, com grande repercussão na qualidade de vida, deve-se testar o efeito de prednisona ou prednisolona a 30 a 40 mg por dia, por cinco a sete dias.(25)

O uso de antibióticos deve ser reservado para casos em que haja alta probabilidade de infecção bacteriana, como nos surtos de traqueobronquite por micoplasma. Diante de um caso de coqueluche, só se justifica o uso de macrolídeo se a tosse tiver duração inferior a 14 dias (tosse aguda).

TOSSE CRÔNICA (no algorítmo e do documento abaixo):

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Leia mais no Documento Oficial:

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http://www.jornaldepneumologia.com.br/detalhe_suplemento.asp?id=25

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